MPF recomenda que Mapa tenha embasamento técnico para relativizar o vazio sanitário da soja
Em agosto de 2023, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) autorizou o plantio antecipado da soja em MT, invadindo o vazio sanitário e aumentando os riscos de ferrugem asiática
Os procuradores do Ministério Público Federal (MPF), Pedro
Melo Pouchain Ribeiro e Marianne Cury Paiva, recomendaram que a Secretária de
Defesa Agrícola do Ministério da Agricultura e Pecuária (SDA/Mapa) reveja os
procedimentos para eventuais alterações no calendário do plantio da soja em
Mato Grosso. A Recomendação foi divulgada nesta segunda-feira (22.04), pelo
MPF.
A Recomendação do MPF foi feita após a Associação dos
Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT) enviar ofício ao órgão,
questionando a decisão do Mapa.
Segundo o documento do MPF, o Mapa concordou em acatar as
recomendações para evitar decisões como a da antecipação do plantio, como
ocorreu em agosto de 2023.
Na época, o Ministério da Agricultura atendeu ao pedido da
Associação Mato-grossense dos Produtores de Algodão (Ampa), permitindo o
plantio da soja a partir de 1º de setembro, invadindo o vazio sanitário, que
tem vigência entre 15 de junho a 15 de setembro.
Nesse período, os produtores são impedidos de manter
qualquer planta viva de soja na lavoura. Conforme ressaltado pela Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a pedido do MPF, o vazio
sanitário é a principal medida fitossanitária para conter a ferrugem asiática,
principal praga da cultura da soja no país.
De acordo com a Recomendação, o Instituto de Defesa
Agropecuária de Mato Grosso (Indea) mostrou-se contrário ao deferimento do
cultivo excepcional de soja no estado do Mato Grosso, pela ausência de
apresentação de embasamento técnico por parte do Mapa para a autorização do
pedido formulado pela Ampa, solicitando, inclusive, ao Ministério,
justificativas técnicas que embasaram a autorização em caráter excepcional no
Estado de Mato Grosso para tal finalidade, e qual seria o plano de prevenção e
controle a ser adotado nos cultivos autorizados em caráter excepcional.
Também consta na Recomendação que os pesquisadores
integrantes da Embrapa, Mauricio Conrado Meyer, Claudia Vieira Godoy e Rafael
Major Pitta, alertaram que os problemas da antecipação do plantio seriam: a
necessidade de utilização de uma quantidade superior de fungicidas para a
contenção da ferrugem asiática e; a
resistência da praga aos produtos utilizados, em razão do alargamento da janela
de plantio.
Nas palavras do procurador do MPF, Pedro Melo Pouchain
Ribeiro, “a concordância da SDA/Mapa, além de ferir a própria base normativa
que a fundamenta, ocasionaria uma série de danos ambientais ao estado de Mato
Grosso, notadamente em virtude da ferrugem asiática, citando, ainda, que a
decisão desta Secretaria foi extremamente temerária e: banalisou a condição de
excepcionalidade estabelecida no art. 10, da Portaria SDA nº865, para o cultivo
de soja independentemente do vazio sanitário e do calendário de semeadura; não
apresentou um embasamento técnico-científico idôneo que demonstrasse a
viabilidade do cultivo de soja ainda dentro do vazio sanitário sem maiores
prejuízos/riscos aos produtores e, principalmente, ao meio ambiente;
desconsiderou todos os riscos/prejuízos elencados pela Embrapa, a mais
importante empresa de pesquisa do Brasil, ligada ao próprio Mapa; desconsiderou
todas as insurgências do Indea e da Aprosoja-MT quanto ao pedido formulado pela
Ampa.
Um importante ponto, também destacado pelo procurador do
MPF, foi o fato de que os prejuízos não se restringiriam apenas às áreas
pertencentes aos produtores que optaram por realizar o plantio excepcional,
sobretudo em razão da facilidade da proliferação da praga pelo ar, mas também
às áreas onde os produtores seguiram o calendário normal de semeadura, pois
estes estariam também sujeitos a maiores danos ambientais.
Para o presidente da Aprosoja-MT, Lucas Costa Beber, “a
decisão da SDA/Mapa não foi apenas temerária, mas também, incoerente e
irresponsável, haja vista que contrariou as próprias normas internas do
Ministério e as orientações técnicas da Embrapa, e também, colocou em risco a
cultura da soja em Mato Grosso e o meio ambiente, além de prejudicar os
produtores que plantaram a partir de 16 de setembro do ano passado, os quais
absorveram a proliferação de fungos da ferrugem asiática daqueles plantios que
foram realizados durante o período proibitivo do vazio sanitário”.
Por fim, a Recomendação do MPF determinou à SDA/Mapa:
promova a complementação da Portaria a SDA nº865/MAPA, especificando,
claramente, quais são as condições de excepcionalidade que autorizam a
relativização do vazio sanitário e do calendário de plantio da soja; que não
autorize a relativização do período do vazio sanitário e do calendário da soja,
constantes no Programa Nacional de Controle da Ferrugem Asiática da Soja, sem a
demonstração da "condição de excepcionalidade", prevista no art. 10,
da Portaria SDA nº865 (ou em posterior regulamentação), subentendida como uma
situação fora do comum, devidamente justificada, de modo que o solicitante ou a
SDA, esta quando da análise do pedido, demonstre, por meio de elementos
técnicos (estudos, pesquisas, pareceres, dados empíricos e outros, elaborados
por instituições públicas e/ou privadas de notório reconhecimento) que os
riscos ambientais do cultivo excepcional são os mínimos possíveis, e que o
respectivo cultivo não comprometa a eficácia das medidas já existentes para o
combate/contenção da ferrugem asiática; que não autorize qualquer tipo de
alteração do calendário do plantio de soja no estado de Mato Grosso (início e
término) sem embasamento técnico (estudos, pesquisas, pareceres, dados
empíricos, e outros, elaborados por instituições públicas e/ou privadas de
notório reconhecimento) que demonstre a ausência de prejuízos ambientais dessa
medida.
O MPF determinou o arquivamento do inquérito para analisar o caso, já que a SDA/Mapa demonstrou boa-fé, reconhecendo a necessidade de alteração da portaria. Por outro lado, o MPF disse ser necessário a instauração de um Processo Administrativo para acompanhamento da “efetiva complementação/alteração da Portaria nº SDA/Mapa”.
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